terça-feira, 7 de outubro de 2008

.a lucidez perigosa

"Estou sentindo uma clareza tão grande
que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
Assim como um cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise.

Estou por assim dizer
vendo claramente o vazio.
E nem entendo aquilo que entendo:
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço.

Além do que:
que faço dessa lucidez?
Sei também que esta minha lucidez
pode-se tornar o inferno humano
— já me aconteceu antes.

Pois sei que
— em termos de nossa diária
e permanente acomodação
resignada à irrealidade —
essa clareza de realidade é um risco.

Apagai, pois, minha flama, Deus,
porque ela não me serve para viver os dias.
Ajudai-me a de novo consistir
dos modos possíveis.
Eu consisto,
eu consisto,
amém."

[clarice lispector]
.

2 comentários:

Josh Ágora disse...

-Hahaha...

Você não sabe o que ocorreu. Enquanto lia, pensando ser de sua autoria o poema, já arquitetava em minha mente o comentário... Eu iria dizer:
"Eu te entendo, isso é semelhante aos momentos de Epifanía descritos por CLARICE LISPECTOR[!!!]"

Comcluo a leitura meio perplexo, afinal realmente se trata de um poema de Clarice.

Ela é simplismente fantástica. Me identifico com esses momentos de epifanía que ela descreve. Isso é algo constante dentro de mim.

Grande Abraço.

Josh.

.ana disse...

hahahahah
não, eu não tenho tanto talento para escrever assim. por isso me espelho nas obras de outros...
e ela é ótima mesmo! apesar de ter coisas um pouco dramáticas/exageradas demais...
;)